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A Espiã Vermelha

LCeT 2020 - RJ

 

Não tem quase nada que se sustente por conta própria durante A Espiã Vermelha, mas, de alguma forma tudo se desmonta no letreiro final, cuja sugestão de que grande parte do roteiro é pura ficção consegue dar outra dimensão à fragilidade da narrativa. É até desconcertante como uma história tão chamativa quanto a da “vovó espiã” Melita Norwood tenha virado uma trama tão tediosa, especialmente quando a inspiração foi uma cena real tão incrível quanto a de uma senhora de mais de 80 anos se defendendo de acusações de espionagem em seu quintal.

É verdade que o roteiro adentra aspectos fascinantes da personagem, oferecendo uma visão do dilema moral único de uma pesquisadora envolvida na criação da bomba atômica durante a transição da 2ª Guerra Mundial para a Guerra Fria. Um dos únicos pontos positivos do filme é explorar a situação de poder fortuito, quase indesejado que a protagonista vivencia. Acontece que já nesse aspecto o texto começa a ruir pela associação infeliz entre as ideologias – mutantes – de Joan e suas paixões.

E que paixões: não bastando um, a roteirista coloca a personagem em dois triângulos amorosos distintos, com uma quantidade proibitiva de reviravoltas e idas e vindas nos relacionamentos. Excessividade esta que se estende para além dos flashbacks, pois a relação central da idosa com seu filho, atarantado pelas revelações sobre a mãe, também é uma gangorra de emoções que dá voltas desnecessárias em diálogos canhestros para criar e depois resolver conflitos.

Nesse imbróglio de motivações e impulsos, Sophie Cookson se mostra dedicada como a jovem espiã, mas logo se vê naufragada pelo roteiro salpicado de excessos, de tal forma que sua expressão de sentimentos variados e díspares é muito menos instigante do que poderia ter sido numa trama mais comedida. Já Dench assegura um papel mais sólido, tendo a simplicidade de uma idosa aparentemente comum e toda a decantação daquele turbilhão de acontecimentos passados para construir um retrato afável de uma pessoa eivada de contradições e conflitos em relação a seus atos. É basicamente o que há em favor do elenco, que, fora essa dupla, desfila apenas atuações equivocadas (Tom Hughes como o amante socialista, Tereza Srbova como uma cansativa emulação de femme fatale) e fracas (Stephen Campbell Moore como o par romântico mais lamentável da história).

Como se não bastasse isso tudo, a montagem termina de drenar qualquer potência dos intérpretes ou das cenas, tornando a passagem de tempo, as transições e o ritmo completamente desfuncionais. Nada contra criar toda uma fanfic para um caso real tão interessante, mas se o resultado é uma fanfic padrão final de Game of Thrones, era melhor ter deixado no papel.

(Red Joan, Reino Unido, 2019. Dir.: Trevor Nunn. 101 min.)

 

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